Do Fonógrafo ao MP3:
Algumas Reflexões sobre Música e Tecnologia
Rodrigo M. Gomes1
Resumo: Este artigo objetiva discutir a interface entre música e tecnologia através de uma análise cronológica do processo de transformação dos meios de gravação e reprodução sonora desde a invenção do fonógrafo por Thomas Edison, em 1877, até a era contemporânea, caracterizada pela portabilidade e volatilidade de mídias digitais como o MP3. Com isso, este trabalho pretende demonstrar como os processos de inovação científica e tecnológica impactam a forma de se produzir, comercializar e consumir música, gerando novos paradigmas técnicos, estéticos e econômicos na indústria fonográfica.
Palavras-chave: Música; Tecnologia; Gravação.
Abstract: This article aims to discuss the interface between music and technology through a chronological analysis of the transformation process of sound recording and reproduction media since the invention of the phonograph by Thomas Edison, in 1877, until the contemporary era, characterized by the portability and volatility of digital media like the MP3. Thus, this article intends to demonstrate how the processes of scientific and technological innovation impact the way through which music is produced, sold and consumed, generating new technical, aesthetical and economical paradigms in the phonographic industry.
Keywords: Music; Technology; Recording.
O Fonógrafo de Thomas Edison e os Cilindros de Cera
No final do século XIX, no ano de 1877, o cientista norte-americano Thomas Edison inventava o primeiro aparato capaz de gravar e reproduzir a fala humana: o fonógrafo. Embora a gravação e reprodução sonora fossem um sonho da ciência desde o século XVI, a invenção proposta por Edison para tal fim revelou-se relativamente simples. Curiosamente, a construção do fonógrafo demandou pouco conhecimento científico e nenhum material novo, uma vez que todos seus componentes básicos já eram conhecidos à época (agulha, diafragma, corneta, parafuso de rotação, cilindro, etc.).
Tal fato pode levar-nos a questionar o motivo de o fonógrafo não ter sido inventado antes. Contudo, é preciso lembrar que as inovações científicas raramente surgem como resultado de insights de seus inventores. Muitos fatores de ordem social, econômica e cultural influenciam a direção da imaginação dos inventores, até mesmo a própria competição entre eles. No caso do fonógrafo, acrescenta-se a todos esses fatores um fator acidental, uma vez que sua invenção foi fruto do esforço de Edison para estender o alcance das linhas telefônicas.
Foi a partir dessa tentativa que ele percebeu que tinha concebido um novo artefato, para o qual sugeriu algumas utilidades em um artigo de 1878 para a revista North American Review, tais como: ditado de cartas, ensino de elocução, registro das memórias vocais de uma família, reprodução de música, preservação de idiomas pela exata reprodução de sua pronúncia, produção de audiolivros para pessoas cegas, brinquedos e caixinhas de música, etc.
Surpreendentemente, hoje todas as funções propostas por Edison foram possibilitadas, em maior ou menor grau, pela gravação sonora, e se num primeiro momento não ficou aparente que a reprodução de música tornar-se-ia o principal foco no desenvolvimento do novo instrumento, isso se deveu à limitada qualidade sonora da qual ele era inicialmente capaz.
Sendo um aparato essencialmente mecânico, o fonógrafo encontrou inicialmente uma série de limitações técnicas e teve de passar por vários melhoramentos até a substituição do cilindro de cera pelo disco de acetato de 78 rotações na virada do século. Mesmo assim, conforme destaca Chanan (1995), uma melhoria significativa da qualidade sonora só seria atingida na década de 20 do século XX, com o advento da gravação elétrica:
The audible limitations of the early phonograph were musically restrictive, and remained so, despite a constant stream of improvements, until the introduction of electrical recording in the mid-1920s, when disc was joined to amplification and the loudspeaker. (CHANAN, 1995, p. 37).
Outro problema crucial que de início limitou o fonógrafo foi o fato de as gravações em cilindro não poderem ser replicadas. Somente com o advento do disco a replicação em massa tornar-se-ia possível e a indústria fonográfica começaria a decolar, tornando-se imediatamente internacional, uma vez que uma gravação poderia ser realizada em um local e transportada para outro para ser produzida e comercializada em massa.
Entretanto, apesar de seus entraves técnicos iniciais, o fonógrafo representou o marco inicial da indústria fonográfica por transformar o som intangível da música em objetos materiais que poderiam ser vendidos e comprados, além de separar física e psiquicamente, através da gravação sonora, a audição e a performance musical, levando a implicações de ordem técnica e estética que viriam a redefinir os modos de produção, comercialização e consumo de música ao longo do século XX.
O Gramofone de Emile Berliner e os Discos de 78 rpm
Em 1887, dez anos após a invenção do fonógrafo por Thomas Edison, o inventor alemão Emile Berliner patenteava o gramofone, aparato que possibilitaria aos cantores obter lucro de royalties a partir da venda de seus fonogramas. Dentre suas principais inovações, o gramofone trouxe a introdução dos discos de sete polegadas e 78 rotações em substituição aos cilindros, e a possibilidade de duplicação das gravações.
Os discos de sete polegadas de Berliner possuíam apenas um lado com aproximadamente três minutos de duração e eram inicialmente produzidos em uma borracha vulcanizada rígida conhecida como ebonite, que tinha a vantagem de não se desgastar tão rapidamente quanto a cera dos cilindros do fonógrafo. Posteriormente, porém, os discos passaram a ser produzidos em goma-laca, material resinoso secretado por um besouro tropical comum na Índia e na Malásia, devido à dificuldade de prensagem da ebonite. Somente na década de 1940 ocorreria a substituição da goma-laca pelo vinil, material que já havia sido desenvolvido desde a década de 1930.
Com o surgimento dos discos, estabelecia-se no início do século XX um novo modelo de consumo, no qual o gramofone tornava-se um instrumento de reprodução que demandava a compra de discos. No entanto, não era possível ainda, ao consumidor comum, realizar gravações, pois esse tipo de equipamento estava indisponível no mercado para uso doméstico. Com isso, as possibilidades técnicas de gravação amadora e doméstica tiveram de esperar o advento das técnicas de gravação sonora magnética, vários anos mais tarde.
Inicialmente, a acústica do gramofone favorecia a gravação de vozes, mas não a de instrumentos, especialmente em grupos. Foram os cantores, portanto, os primeiros a se beneficiarem do invento de Berliner, principalmente os de estilo operático. Além de privilegiar certos estilos de performance e de interpretação musical em detrimento de outros, o gramofone também introduziu mudanças de ordem estética, devido à limitada duração dos discos de 78 rotações:
The need to squeeze the music onto the side of a 78 r.p.m. record had a number of different effects, damaging to classical and popular music alike. Since few pieces (…) were short enough, tempi were often adjusted, repeats deleted and sections excised, with evident compromise in matters of style and interpretation. (CHANAN, 1995, p. 48).
O fato, contudo, é que o gramofone revolucionou a música popular a tal ponto que podemos afirmar que a duração consagrada das canções populares, até hoje – em torno de três minutos – é resultado de seu advento.
A Gravação Elétrica e o Microfone
Em meados da década de 1920, a indústria fonográfica passou por uma série de transformações acarretadas pelo advento do rádio e pela substituição da gravação mecânica pela gravação elétrica, que não apenas representou um importante avanço em qualidade, mas também introduziu alterações tanto na prática de gravação quanto na experiência auditiva.
Avanços na tecnologia de amplificação elétrica, que incluíam o microfone, proporcionaram aos cantores de blues, country, jazz, e cantores populares em geral, a habilidade de projetar suas vozes como nunca antes. Os cantores não precisavam mais ter vozes operáticas para preencher um salão ou para serem ouvidos em meio ao ruído produzido por uma banda. A amplificação elétrica proporcionou aos cantores populares um novo conjunto de possibilidades, e o microfone foi acolhido tanto pelo seu caráter de amplificação da voz como por ser uma ferramenta de expressão com técnicas próprias.
Segundo Morel (2010), se antes do surgimento do processo elétrico de gravação somente os cantores que possuíam vozes possantes estavam aptos a realizar gravações, “(...) o processo de inovação tecnológica propiciou o melhoramento da captação e gravação das vozes (...) e possibilitou o registro de qualquer tipo de voz” (MOREL, 2010, p. 33), franqueando acesso aos cantores de “voz pequena” e alavancando a popularização de gêneros musicais como a Bossa Nova.
Com a substituição dos sistemas mecânicos precedentes, o aparato de gravação agora não precisava ser colocado no mesmo espaço dos músicos, inaugurando-se assim o modelo de estúdio moderno com uma sala de controle separada, que se tornou domínio do engenheiro. Além disso, o microfone libertou os músicos ao permitir um posicionamento mais natural de cantores e instrumentistas.
Em resumo, a gravação elétrica possibilitou uma performance mais artística e confortável, e embora houvesse aqueles que, frente ao acúmulo de aparatos, considerassem a gravação elétrica como um processo de “distorção sonora”, sua importância para a criação musical é incontestável, uma vez que, perfeita ou imperfeita, qualquer gravação é uma distorção da realidade. Em outras palavras, a gravação sonora nunca foi um processo transparente, mas a manufatura de um produto a partir de uma matéria-prima bruta.
Os Discos de Vinil e os Álbuns Conceituais
A introdução dos discos de vinil no mercado fonográfico, no final da década de 1940, representou uma nova mudança de paradigma na indústria musical. Com uma maior qualidade sonora e uma capacidade de armazenamento de aproximadamente quarenta minutos de música (vinte minutos em cada lado), os Long Plays (LPs), como também são denominados, possibilitaram a suplantação dos antigos discos de goma-laca de 78 rotações, com média de três minutos de reprodução em cada face.
Um fator por trás do desenvolvimento do LP foi a busca por uma alternativa material ao acetato quando os suprimentos de resina foram drasticamente reduzidos durante a Segunda Guerra. Durante certa época, nos Estados Unidos, algumas lojas de discos chegavam ao ponto de pedir aos compradores que devolvessem seus discos velhos na compra de discos novos, a fim de reciclar o material.
Uma vez lançado, o LP foi um sucesso instantâneo no mercado da música erudita. Em um curto período de tempo, a ideia de trocar o disco a cada três ou quatro minutos, e continuar a sofrer as constantes interrupções, tornou-se insuportável. Com os discos de vinil, superou-se a limitação técnica de gravação de apenas duas canções por disco e gerou-se a possibilidade de se produzir discos com maior extensão e quantidade de canções, e também a possiblidade de se gravar as peças do repertório erudito, em geral mais extensas. Tal possibilidade encontra-se diretamente relacionada ao advento e ao estabelecimento da cultura do álbum conceitual, que se tornou o carro-chefe da indústria fonográfica, principalmente nos final dos anos 60 até meados dos anos 70, e foi responsável pela gradual perda de popularidade do formato single.
Com o surgimento da estética do álbum, os discos passaram a ser encarados como uma unidade conceitual, e não apenas como uma coleção de canções desconexas. Enquanto uma unidade coesa, o álbum conceitual estabeleceu-se como um formato no qual a obra composta pelo conjunto das canções é tão importante quanto as canções individuais, cujo sequenciamento é previamente pensado pelos artistas e produtores, e entre as quais pode haver um encadeamento ou relação, como no caso de álbuns conceituais como Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band, dos Beatles, Dark Side of the Moon, do Pink Floyd, Tales from Topographic Oceans, do Yes, A Night at the Opera, do Queen, dentre outros.
As Fitas Magnéticas e o Estúdio de Gravação
O primeiro sistema de fita magnética foi demonstrado na Alemanha pelo engenheiro germânico-austríaco Fritz Pfleumer, no final da década de 1920, usando papel recoberto com óxido metálico. Somente em 1934 o sistema seria lançado comercialmente com a utilização de fitas plásticas.
Com o processo de edição da fita magnética, não era mais necessário selecionar o melhor dos vários takes de uma composição completa, uma vez que uma versão “perfeita” poderia ser montada a partir de vários takes “imperfeitos”. Além disso, a técnica promoveu o papel do produtor, que passou a ser responsável não apenas por pagar as contas e organizar as sessões de estúdio eficientemente, mas também por supervisionar o estágio de pós-produção, que agora se tornara mais importante.
Com as fitas magnéticas, o estúdio de gravação também se tornou um laboratório de experimentação musical no qual muitas vezes criavam-se sons irreprodutíveis em performances ao vivo e onde se desenvolviam novas técnicas de edição e criação musical, dentre as quais se destaca o overdubbing.
One of the techniques improved and facilitated by tape recorders was overdubbing, an additive process whereby successive performances are combined or overlaid with one another within the unitary time frame represented by a disc or a piece of magnetic tape, creating the illusion of an ensemble performance. (ZAK III, 2001, p. 10).
Com o gradual desenvolvimento e aperfeiçoamento da tecnologia nas décadas seguintes, em meados dos anos 1970 foram introduzidas no mercado as fitas-cassete, que não chegaram a constituir uma concorrência ao vinil devido aos ruídos gerados em seu processo de reprodução e à sua reduzida durabilidade em relação aos discos. No entanto, a possibilidade de o ouvinte organizar aquilo que queria ouvir num suporte constituiu o seu principal diferencial, acarretando várias mudanças no comportamento e modo de apreciação musical dos ouvintes. Como nota Crowl (2009), por exemplo, “a circulação de gravações independentes, bem como a pirataria de gravações comerciais, começou a se fazer notar por meio das fitas K7s.” (CROWL, 2009, p. 147).
As Mídias Digitais
O processo de digitalização das mídias musicais, em substituição às mídias analógicas precedentes, teve início a partir da invenção e comercialização dos discos compactos. Surgidos em meados do início da década de 1980 com uma capacidade de armazenamento bem superior à de um disco de vinil e um pouco menor que a de uma fita-cassete de noventa minutos, o CD (Compact Disc) apresentou a possibilidade de execução contínua de até 79 minutos de áudio com níveis de ruídos e distorção praticamente desprezíveis, embora o grau de fidelidade das gravações armazenadas nesse tipo de mídia, em relação às mídias analógicas como o vinil, seja ainda hoje discutível. Sobre a qualidade sonora das gravações digitais, Crowl (2009) afirma que:
Para muitos ouvidos mais exigentes, (...) o som puro dos equipamentos digitais não superara a qualidade do som analógico estereofônico de alta fidelidade dos discos de vinil produzidos já nas décadas de 1970 e 1980. O fato é que os aparelhos de reprodução analógica de alta qualidade tornaram-se muito sofisticados, caros e de manutenção relativamente complexa, exigindo o uso de agulhas muito leves e precisas, que estão sujeitas a um desgaste relativamente rápido devido ao atrito com a superfície do disco. (CROWL, 2009, p. 149).
Apesar disso, o CD estabeleceu um sólido reinado na indústria fonográfica durante muitos anos, perpetuando a cultura do álbum musical iniciada com os discos de vinil, até o surgimento de uma mídia digital não-física que revolucionaria a produção, circulação e apreciação musical, afetando o modo como todos os atores envolvidos na cadeia produtiva da música popular de massa se relacionam com a música até os dias de hoje: o MP3.
Desenvolvido primeiramente em 1987, o formato tornou-se, com a popularização da internet, ao longo dos anos 1990 e início dos anos 2000, um padrão para a compressão de áudio capaz de reduzir consideravelmente o tamanho de um arquivo digital sem perda aparentemente significativa da qualidade do som, sendo a volatilidade e a portabilidade suas principais vantagens sobre qualquer outro suporte de áudio. Em outras palavras, os arquivos MP3 podem ser armazenados em praticamente qualquer tipo de suporte físico digital (discos rígidos, CDs, DVDs, pendrives, etc.), além de poderem ser obtidos gratuitamente, por meio de downloads.
Essas características proporcionadas pela imaterialidade do formato MP3 têm, ao longo dos últimos anos, transformado radicalmente os hábitos de consumo de música de ouvintes em todo o mundo, diminuindo drasticamente a venda de CDs e os lucros obtidos pela indústria fonográfica. Hoje é possível ter acesso, por um custo absolutamente nulo, a um grande acervo de canções disponíveis para download na rede mundial de computadores, que podem ser ouvidas numa diversidade cada vez maior de aparelhos portáteis desenvolvidos pelas empresas do setor de computação e telefonia, como iPods, tablets, telefones móveis, etc.
Considerações Finais
Desde seu surgimento, com a invenção do fonógrafo por Thomas Edison em 1877, a gravação sonora tem possibilitado a captura de um fenômeno temporal e por natureza fugaz: a música. Embora inventada para gravar a palavra falada, o maior impacto cultural da gravação sonora tem sido através da música, que vem sendo transformada ao passo que seus processos de produção e audição têm sido permeados pela tecnologia. De fato, a gravação sonora tem tido uma profunda influência na maneira pela qual a música é produzida, ouvida, e pensada. Com a habilidade de transformar o ato efêmero da performance musical em um trabalho de arte, sua influência tem sido sentida em praticamente todos os gêneros musicais.
Com a presença do artista se tornando secundária, pelo menos cronologicamente, em relação à sua presença sonora descorporificada emanada através dos alto-falantes, as gravações começaram a assumir um tipo diferente de identidade. A “criatividade artística” passou a ser direcionada para a criação de uma voz gravada. Com essa mudança de atitude, as gravações passaram quase que inevitavelmente de um processo de coleta, preservação e disseminação para um processo de produção. O critério estético mudou do som da performance ao vivo para o som da gravação.
Além disso, a partir do surgimento dos primeiros discos de 78 rotações, a gravação sonora possibilitou a ampla disseminação da música em escala global. Hoje, com a popularização do formato MP3, esse fenômeno tem sido ampliado exponencialmente, a ponto de qualquer gênero musical poder chegar aos ouvidos de qualquer camada social de qualquer lugar do mundo. Músicas de todas as sociedades e de todos os períodos históricos estão disponíveis ao toque de uma tecla, e com isso a experiência da audição musical tem sido radicalmente alterada. Nesse aspecto, conforme comenta Morel (2010):
Nunca foi tão fácil ouvir música como nos dias atuais. Se antes era necessário se dirigir a alguma loja especializada para consumir música e depender do acesso a discos importados para se ter acesso ao material produzido fora do país, hoje em dia, na frente de um computador pessoal, qualquer indivíduo pode escutar música produzida nos quatro cantos do mundo. A existência dos programas de computador que possibilitam a troca de arquivos entre os usuários conectados se tornou uma das principais fontes de acesso à música gravada. (MOREL, 2010, p. 42).
Dessa forma, podemos afirmar que o modelo tradicional de produção, venda e consumo de música vigente durante o século XX passa atualmente por um período de crise. Se com o fonógrafo estabeleceu-se a base da indústria fonográfica, fundada na possibilidade de materialização da música em objetos concretos comercializáveis, hoje o MP3 representa um processo inverso de desmaterialização da música que põe em xeque a própria lógica dessa indústria.
É vivido um momento de incerteza e contradição em que muitas dúvidas a respeito do futuro das mídias antigas e da própria música merecem investigação. Poder-se-ia afirmar, por exemplo, que o álbum enquanto unidade física, concreta e indissociável, e como única forma de consumo de música, perdeu grande parte da hegemonia conquistada no século anterior. Diante desse panorama, cabe questionar o futuro do formato do álbum conceitual no mercado fonográfico e sua atual popularidade em termos da apreciação, por parte do ouvinte contemporâneo, do álbum como um “pacote de canções”. Cabe investigar, também, se a indústria fonográfica estaria seguindo uma tendência de retorno ao formato do single e se o atual crescimento na fabricação e comercialização de vinis representa um fenômeno de “saudosismo” e fetichização em relação à mídia decorrente da redução da supremacia do álbum ou ainda se, ao contrário, representa um fenômeno de fortalecimento e revitalização do formato.
De qualquer modo, com base no breve panorama histórico exposto neste artigo, fica evidente o modo como os avanços científicos e tecnológicos impactaram e continuam impactando a música em todos os seus aspectos e dimensões, gerando modelos estéticos e econômicos que são continuamente reconstruídos ao longo do tempo.
Referências
CHANAN, Michael. Repeated Takes: A Short History of Recording and Its Effect on Music.London: Verso, 1995.
CROWL, Harry. A criação musical erudita e a evolução das mídias: dos antigos 78rpms à era pós-CD. In: PERPETUO, Irineu Franco; SILVEIRA, Sergio Amadeu. (Orgs.) O Futuro da Música Depois da Morte do CD. São Paulo: Momento Editorial, 2009, p. 143-157.
MOREL, Leo. Música e tecnologia: Um novo tempo, apesar dos perigos. Rio de Janeiro: Azougue Editorial, 2010.
ZAK III, Albin J. The Poetics of Rock: Cutting Tracks, Making Records. Los Angeles: University of California Press, 2001.
11Aluno do Bacharelado em Ciências e Tecnologia da ECT-UFRN. Bolsista de iniciação científica do projeto de pesquisa Grupo de Estudos Interdisciplinares em Música Popular (Propesq-UFRN), coordenado pelo Prof. Dr. Lauro Meller.